Cristiane Batistela - Foto: Arquivo pessoal

Cristiane Batistela, uma física santista, desenvolveu um novo modelo matemático que auxilia no combate à Covid-19. Ela integra um grupo de pesquisadores da Escola Politécnica (Poli) da Universidade de São Paulo (USP), que desenvolveu o método.

A santista é professora de Física e Matemática e vem desenvolvendo seus trabalhos no Departamento de Engenharia de Telecomunicações e Controle da Poli, onde está no programa de pós-doutorado.

O modelo criado por Cristiane, junto com o professor José Roberto Castilho Piqueira, é capaz de mostrar como ocorre a propagação do vírus. A pesquisadora propôs uma alteração em um modelo muito conhecido chamado SIR, publicado nos anos 20, que divide a população em grupos.

Cristiane é formada em Física e divide seu tempo entre salas de aula e os estudos realizados no Laboratório de Automação e Controle (LAC), da Escola Politécnica. Ela dá aulas em escolas de nível médio, cursos pré-vestibulares e faculdade. Em Santos, no colégio e no curso Objetivo e na faculdade do Senai. Em São Paulo, na rede Poliedro.

Folha Santista: O que é, como funciona e quais os objetivos do seu método matemático que reduz os danos causados pela Covid -19 e ajuda as políticas públicas?
Cristiane Batistela:
O início do uso da Matemática para o estudo da dinâmica populacional de uma doença (varíola) foi feito por Bernoulli (1760), que analisou as taxas de mortalidade decorrente da infecção pelo vírus da varíola, bem como estudou os riscos e vantagens associados à inoculação preventiva. De forma bem genérica, um modelo matemático é uma simplificação abstrata, que permite gerar previsões de um comportamento sob diferentes condições. Um modelo matemático que pretende estudar a propagação de um vírus, durante uma pandemia, pode responder várias perguntas e elucidar as estratégias de controle de propagação do vírus. O Modelo SIR, proposto por Kermack & McKendrick em 1927, é um dos mais utilizados para a representação de doenças infecciosas. A partir deste, são retiradas premissas básicas para a construção dos demais modelos. Esse modelo epidemiológico analisa a disseminação de uma doença e divide a população em três grupos: suscetíveis (S) – indivíduos que podem contrair a doença; infectados (I) – indivíduos que podem transmitir a doença; removidos/recuperados (R) – indivíduos que não estão sujeitos à nova contaminação / recuperaram da doença (imunidade) ou estão removidos da população (óbito). O modelo proposto divide o grupo dos removidos em outros dois: em indivíduos que adquiriram imunidade (I2) e em indivíduos que entraram em óbito (O).

Folha Santista: Como surgiu a ideia e quem faz parte do projeto?
Cristiane:
Esse estudo de modelo epidemiológico tem ocorrido há certo tempo pelo grupo de pesquisa, que possui perguntas desafiadoras. Especificamente o modelo apresentado na nota técnica elaborada juntamente com o Prof. Dr. José Roberto Castilho Piqueira, ocorreu no início da suspensão das atividades, na prespectiva de contribuirmos ao “olharmos” não só para o grupo de óbitos, mas para o grupo dos “imunizados”.

Folha Santista: Como fazer com que esse modelo seja usado nas cidades?
Cristiane:
É necessário “calibrar” os parâmetros, que popularmente chamamos de “taxas” (taxas de infecção, taxas de recuperação, taxas de óbito), trabalho esse que já foi iniciado e num momento posterior propor algumas alterações no modelo, como por exemplo, adicionarmos o grupo dos infectados assintomáticos e avaliar as estratégias de controle da propagação de vírus.

Folha Santista: Em sua opinião, quais os principais problemas encontrados na condução do combate à pandemia no Brasil?
Cristiane:
A luta pelos dados. É necessário realizar testagem em massa, ter processamento rápido dos exames e agilidade no sistema de notificações.

Folha Santista: Como foi sua trajetória, saindo de Santos e ganhando notoriedade nacional com esse trabalho?
Cristiane:
Fiz bacharelado em Física no Instituto de Física da Universidade de São Paulo (IFUSP) e depois ingressei no mestrado em engenharia elétrica na Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (EPUSP), estudando medida de complexidade em um fenômeno biológico. Já no doutorado, aprimorei minha pesquisa em estudo de propagação de vírus em computadores, usando modelos epidemiológicos (modelo de propagação de doença) sob olhar atento a um modelo proposto pelo professor Piqueira, que estudou a inclusão de um novo grupo de compartimento em uma população, constituída pelos antidotais. Hoje, no pós-doutorado, estudo o que chamamos de sistemas não lineares e a influência da variação de parâmetros (que são essas taxas) na mudança de comportamento dos sistemas. 

Folha Santista: Em sua avaliação, como está a situação da pesquisa em universidades hoje em dia no país?
Cristiane:
A situação da pesquisa em universidades no país sempre foi muito delicada. A pesquisa no Brasil não é vista como prioridade e, consequentemente, há pouco investimento, verba e incentivo aos estudos. Nos últimos anos, essas condições foram mais precárias, com cortes de bolsas de estudos e falta de reconhecimento das atividades executadas nas grandes universidades do país. Fazer pesquisa de alto nível requer investimento contínuo em laboratórios e estruturas, professores, estudantes e funcionários.