Foto: Kamila Drieli

Como se dão as nossas mudanças? Qual engrenagem de repente altera seu funcionamento e nos faz, do dia pra noite, mudar uma percepção, desconstruir uma ideia, alterar uma preferência?

Semana passada estive andando pelo Rio de Janeiro e observei com alegria as tantas cores espalhadas por Santa Teresa, vi esperança em cada pintura, senti no ar uma brisa resistente, de quem não muda de princípios para agradar, de quem é bom. A arte se refugia em janelas e hidrantes, basta olhar com cuidado os vitrais durante a noite, é tudo arte, tudo beleza e poesia.

Prestar atenção me mostra que muitas coisas sempre estiveram ali, embaixo dos meus olhos, por mais que mil vezes eu tenha fingido não ver.

Será então que essa leveza que me toma pelos braços hoje sempre existiu aqui dentro? Eu reconheço as incontáveis vezes que confrontei minha intuição, não admitia que aquilo pudesse ser definitivo, aquele arrepio, aquele sussurro dizendo “isso não é pra você”.

Notem que a mágica da vida dispensa astrólogos e sacerdotes. A magia é intrínseca, a magia nasce dentro de mim, junto comigo. Esse mecanismo que me faz sentir que aquele lugar, aquela pessoa, não me cabem. Loucura é ignorar esse milagre. E eu quase me envergonho de tanto ter feito isso.

De certa forma observar o comportamento das pessoas deve ser infortúnio adquirido com os muitos anos de terapia, desde novinha, que com certeza contribuíram imensuravelmente para a racionalidade que me soa tão natural hoje, mas também me deu esse ar de estar sempre fazendo perguntas que não gostam de ouvir e muito menos de responder. Daí as conversas sempre parecem a primeira sessão com uma psicóloga.

Eu já pedi desculpas por ter dito algo que achei ofensivo numa segunda análise. Eu já procurei pessoas que supus ter magoado por não conseguir conviver com o fato de que eu tinha causado dor a alguém, de que eu também fazia escolhas erradas. Thomas Hobbes diria que foi puro egoísmo, mas e se existir algum altruísmo também nas ações humanas?

Não gosto de terminações rígidas. Acredito que a educação, o exemplo presente, mudam o jogo. Diante dos cenários que nos cercam, diria que é importante repensar pensamentos, posições, lugares, papéis. É preciso repensar toda uma existência para que um vislumbre de esperança seja possível.

Ver tantas atrocidades circulando confortáveis em plena luz do dia tira, por um instante, toda a minha capacidade de achar racional ter sido mãe. Isso me dilacera.

É por isso que algo maior em mim precisa acreditar que Rousseau estava certo quando disse que “o homem é naturalmente bom”.

É nisso que eu acredito, somos bons, estamos perdidos.

Naturalmente bons e em busca de melhorar.

*Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião do Folha Santista.

Escritora, mãe, mulher e formada em Biologia Marinha. Na infância, lia livros de fantasia. Com o passar do tempo, a escrita se tornou essencial. Seu primeiro livro – “A Portadora da Luz” – está disponível na Amazon. Hoje, ela usa diferentes meios para se expressar: música, desenho, poesia e fotografia.