Foto: Kamila Drieli

Eu sou uma pessoa.

Eu sou uma pessoa.

Eu sou uma pessoa.

Repetia.

Eu sou uma pessoa.

– Sendo assim, porque eu deveria então estar ilesa aos sentimentos humanos? O que exige de mim, que eu tenha algo que você não tem e por isso mesmo me ataca?

Me sinto levemente Shakesperiana, devo ser, vez ou outra, me cai bem a profundidade da tragédia. Deve ser a intensidade dos meus desejos, as vontades da minha alma que transcendem as arestas do meu corpo e me fazem ser tão humana quanto quem me lê, quem me admira, quem enxerga uma inspiração em mim.

Minhas palavras não são apenas o escoar do que sou, é também tudo que eu almejo me tornar. Não sou impostora, por isso, sou uma pessoa. A consciência não me blinda da atitude. Eu erro. Querer ser de determinada forma, mas não caber numa forma. Sou humana.

Eu queria ser mais autoconfiante, não por duvidar das minhas qualidades, quer dizer, pode ser exatamente por isso. Entende, às vezes eu sangro ao questionar quem eu sou, como se toda a minha história tivesse sido inventada, como se tudo perdesse a cor. De repente eu penso “quem eu penso que eu sou?”.

Quando, na verdade, eu estou cada dia mais perto de ser eu. Eu mesma, sem me importar com a visão limitada, fracionada e superficial que outras pessoas possam ter sobre mim.

Quem nos conhece de fato? Me aponta uma única pessoa que sabe tudo sobre você. Eu quis dizer TUDO. Você pode me responder? Eu não posso. Porque ainda que eu quisesse contar tudo, seria impossível, escapariam detalhes, eu falaria carregada da minha visão pessoal, aquilo não seria a verdade, seria a minha forma de enxergar, minha íris, minha ótica, minha experiência.

E porque tenho consciência, faz piorar. Sinto vergonha de assumir meus equívocos inerentes à minha espécie exatamente por viver num mundo que respira perfeição. Tudo é feito para melhorar algo. Nossa vida, nossos corpos, nossos vícios. Eles nos cobram a perfeição, porque a perfeição não existe. E quanto mais se busca algo que não existe, mais se deixa de existir.

Eu sou uma pessoa em busca de melhorar.

Eu gosto de pensar sob a perspectiva do Humano ideal, vou batizá-lo cientificamente de Homo ratio, dentro desta minha linha de raciocínio existe um ideal de ser humano. As pessoas pregam que somos diferentes, e somos, mas buscamos as mesmas qualidades em diferentes pessoas.

Por exemplo, você quer se relacionar com pessoas amorosas ou com pessoas frias e duras? Com pessoas amorosas, claro. Mas as pessoas podem ser amorosas de formas diferentes, claro. Então, o que muda é a forma como emitimos os sinais, demonstramos nossos sentimentos. Então, o ideal é ser amoroso, o que pode variar é a forma como esse amor é transmitido.

O ideal é ser empático. Mas as pessoas estão em níveis diferentes de vida, fase, lua, ciclo. Eu, num nível. Você, noutro. Mas a busca é a empatia máxima, é me ver a tal ponto no lugar do outro que sentirei dor semelhante e farei algo a respeito. Como eu puder naquele momento. De repente, por isso escrevo, porque é uma forma sucinta e direta de ajudar pessoas que eu sequer conheço. É a forma como eu posso hoje, agora. Tudo que eu escrevo está em prática na minha vida? Não, claro que não.

Isso torna o que escrevo uma mentira? Nunca, nem uma linha. As fotos nas redes sociais podem esconder verdades menos perfeitas. Mas as palavras não. Não as minhas.

Mas eu sou uma pessoa, eu estou aprendendo.

O que eu faço é dividir meu processo de pensamento. Eu chego a conclusões, escrevo, reajo. Às vezes, na prática, sofro, racho. E levanto no dia seguinte com um mundo inteiro me olhando com raiva. E eu saio da cama, encaro. E eu só queria o colo da minha mãe.

Sou uma pessoa, minha busca é melhorar.

Me vejo e me acolho como sujeito, sujeito ao erro. E me vejo e me acolho como quem assume e encerra. Não me responsabilizo pelo que não me cabe. Olho no espelho e reconheço a mulher que eu busco ser, e que erra para chegar lá. E se frustra, e chora. Mas não desiste.

Hoje eu encaro mais um dia.

Eu sou uma pessoa.

Eu estou aprendendo.

Com amor, Ka.

*Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião do Folha Santista

Escritora, mãe, mulher e formada em Biologia Marinha. Na infância, lia livros de fantasia. Com o passar do tempo, a escrita se tornou essencial. Seu primeiro livro – “A Portadora da Luz” – está disponível na Amazon. Hoje, ela usa diferentes meios para se expressar: música, desenho, poesia e fotografia.