O promotor Thales Ferri Schoedl, que irá a júri popular - Foto: Reprodução/TV Tribuna

Um crime brutal e absolutamente banal ocorrido há 20 anos, que teve repercussão em todo o Brasil por muito tempo, ao que consta, deve agora ter o seu capítulo final com a realização de um júri popular no próximo dia 3 de junho.

Era noite de 30 de dezembro de 2004, portanto véspera de Réveillon, quando um novato promotor de justiça de São Paulo, então com 26 anos, disparou com sua pistola .380 contra um grupo de jovens que, segundo sua versão, teriam lançado “cantadas” para sua namorada, de 19 anos, no badalado condomínio da Riviera de São Lourenço, em Bertioga, deixando um morto e um ferido.

O autor dos tiros foi Thales Ferri Schoedl. A vítima fatal chamava-se Diego Mendes Modanez, um jogador de basquete, e o sobrevivente era o estudante Felipe Siqueira Cunha de Souza, ambos com 20 anos, moradores do interior paulista que passavam férias à beira-mar.

A partir daí, uma verdadeira celeuma se instalou e por uma década e meia o caso teve idas e vindas, com o jovem promotor sendo preso em flagrante e posteriormente solto, exonerado do Ministério Público, para depois ser readmitido, para, por fim, ser desligado definitivamente da instituição.

 

Diego Mondanez, a vítima fatal do crime ocorrido em 2004 Foto: Reprodução

Ele ainda foi absolvido, em 2008, por 23 votos a 0 pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), já que tinha foro privilegiado à época do crime por ser integrante do MP, decisão revertida 10 anos depois, em 2018, pelo ministro Dias Toffoli, do STF, que determinou a realização de um júri popular para Schoedl, visto que ele já não era mais promotor e que, portanto, não tinha vitaliciedade de tal prerrogativa por ter sido expulso do órgão. O julgamento do acusado ocorrerá no Fórum Criminal de Bertioga, município que foi palco do crime.

Pai de uma das vítimas revive drama e pede justiça

O médico Wilson Pereira de Souza, pai de Felipe Siqueira Cunha de Souza, o rapaz que sobreviveu aos tiros disparados pelo ensandecido promotor em suposta crise de ciúmes, falou com exclusividade à reportagem da Fórum sobre o anúncio do júri popular do réu no próximo mês, mas relembrou também como foi aquele trágica noite na Baixada Santista.

“Eu estava com a minha família lá em nossa casa, na Jureia de São Sebastião, para passar o Réveillon, eu, minha esposa, o Felipe, o Diego, minha filha Fernanda e o namorado dela. Só que na madrugada recebemos um telefonema pedindo para irmos urgente ao pronto-socorro de Bertioga, porque meu filho Felipe tinha sido ferido gravemente. Fomos desesperados para lá, cerca de 30km de nossa casa. Eu cheguei lá e só então soube que o Diego também tinha sido baleado pelo Thales, o ex-promotor, e chegando lá os dois já estavam de saída. O Felipe indo para o Hospital Santo Amaro, em Guarujá, e o Diego para a Santa Casa de Santos, mas infelizmente quando o Diego chegou em Santos ele tinha acabado de falecer… E eu, eu fui na ambulância acompanhando o Felipe, porque sou médico. Eram 7h quando entramos no hospital de Guarujá e estava na troca de plantão. Eu sei como é esse momento, e troca de plantão é uma coisa demorada, complicada. Eu ficava cada vez mais agoniado vendo a situação do meu filho naquele estado”, recordou Wilson.

Graças a uma rápida ação do pai desesperado, que lembrou de um colega de profissão da região, um cirurgião experiente e habilidoso pôde ser chamado às pressas ao Hospital Santo Amaro, em Guarujá, por intermédio desse amigo, para que realizasse o complexo e invasivo procedimento no abdômen de seu filho.

“Naquele desespero, eu lembrei de um grande amigo e também médico, o doutor Fausto Figueira, que me indicou rapidamente um colega para assistir o Felipe e fazer o ato operatório. E isso foi decisivo para que ele sobrevivesse. Foi uma cirurgia de cerca de três horas de duração, e ele saiu de lá e ficou ainda mais um dia no pós-operatório na UTI, e eu providenciei a transferência dele para o Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo, onde ele ficou mais três semanas internado, onde foi reoperado para acertar detalhes daquilo que já havia sido feito em Guarujá, avaliar o fígado dele também, que tinha uma bala, e que está lá até hoje porque não foi possível operar”, acrescentou o pai e médico.

Sobre o julgamento, aguardado há duas décadas e depois de tantas reviravoltas no caso, Wilson diz que não é possível aceitar que aquela tragédia fique sem uma punição para seu autor.

“Nós estamos aí, já quase 20 anos nesse embate para que se faça realmente justiça, porque foi um ato tresloucado desse ex-promotor e que não pode ficar impune”, concluiu o pai.