Ao deixar a bela cidade de Villa Clara, em Cuba, a jovem médica Maibel Martínez Verea, de 31 anos, não imaginava que, pouco mais de três anos depois, enfrentaria uma das maiores dificuldades de sua vida.
Contratada para atuar no Programa Mais Médicos, Maibel, clínica geral, com especialização em Saúde da Família, revela que está no Brasil desde março de 2017, quando começou seu contrato para trabalhar em São Vicente.
Logo que assumiu a presidência da República, Jair Bolsonaro decidiu extinguir o Mais Médicos, que levava profissionais de Saúde para os lugares mais distantes do país. A partir daí a situação financeira de Maibel deu uma reviravolta.
“Só consigo pagar o aluguel graças ao dono do imóvel, que abaixou o valor, por causa da pandemia de coronavírus”, lamenta a médica.
Para enfrentar as dificuldades, Maibel trabalhou de cuidadora de idosos e empregada doméstica. “Quando teve início a pandemia, fui mandada embora. No momento, estou fazendo faxinas e bolos. Tenho amigos que me ajudam, com comida e dinheiro”.
Maibel é casada e seu marido trabalha meio período em uma empresa de eletrodomésticos. Mesmo assim, a vida está bem difícil para o casal, que não tem filhos.
Sem arrependimento
Apesar da atual situação, a médica mantém esperança de dias melhores. Por isso, quer ficar no país. “Não estou arrependida por ter ficado no Brasil. Porém, estou decepcionada, porque acreditava que o novo governo brasileiro daria uma oportunidade de trabalho para os médicos cubanos”, diz.
“Penso em voltar para Cuba para visitar minha família. Quero, por enquanto, ficar por aqui. Estou estudando muito para conseguir o Revalida” (exame exigido para médicos formados no exterior atuarem no Brasil).
Cuba, dona de uma medicina que é referência, especialmente na área de Saúde da Família, é historicamente reconhecida por enviar brigadas de profissionais para inúmeros países, que necessitam de apoio de médicos. Assim foi feito no Brasil.
O Programa Mais Médicos foi criado em 2013 para enfrentar o problema crônico da falta de profissionais, além de aprimorar a Atenção Básica no país, principalmente nas regiões mais carentes.
“Acho que Cuba faz um trabalho solidário e envia médicos para outras partes do mundo, independentemente dos interesses políticos e econômicos de ambos os governos. É humanista, porque levamos saúde até os mais necessitados. É a verdadeira essência da medicina e a mais humanitária”, resume a especialista em Saúde da Família.
O que é medicina
Aliás, quando fala sobre seu ofício, Maibel parece esquecer as dificuldades momentâneas impostas pela vida no Brasil.
“Para mim, a medicina é simplesmente tudo. Sempre quis, desde pequena, estudar medicina, eu gosto. Mais do que isso, eu adoro. O ser humano é perfeito, mesmo que viva em uma sociedade injusta. Sempre adorei contemplar o rosto de um paciente quando o curei ou aliviei sua dor”, reflete.
Ela explica o que é ser um médico de verdade, quando a escolha é por vocação. “O povo deste país precisa de médicos que se envolvam com os pacientes, como se fossem sua própria família. Um médico que se coloque no lugar deles, que fale com eles, com paciência e amor. Se não fosse trabalhar como médica, qual sentido teria minha vida? Foram seis anos de muito sacrifício para mim e para minha família. Com o objetivo de dedicar minha vida a cuidar da vida dos outros, praticando o amor ao próximo. Porque, simplesmente, a medicina é lutar contra a morte e, ao mesmo tempo, é carregar o peso da incerteza”, completa Maibel.