Formado em Ciências Humanas e Sociais e em Relações Internacionais, Guilherme Prado Almeida de Souza, de 30 anos, é o candidato a prefeito do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), número 50, sem apresentar coligação.
Ele dá continuidade à série de entrevistas com os 16 candidatos a prefeito de Santos.
“O grupo político que governa a cidade por mais de 20 anos, ao lado de outros velhos grupos econômicos e famílias, foi incapaz de resolver problemas estruturais da cidade: enchentes continuam, educação que não atinge as metas no Ideb, desigualdade profunda entre regiões, transporte caro, dentre outros tantos problemas. Essa minoria já teve sua chance”, avalia.
A bancária Eneida Figueiredo Koury (PSOL), de 59 anos, é a candidata a vice.
Folha Santista: Por que o senhor é candidato a prefeito de Santos?
Guilherme Prado: Nosso projeto é coletivo, queremos transformar Santos na cidade que ela pode ser. Apesar de linda, ela se encontra decadente, cortada pela chaga da desigualdade, fechando postos de emprego e sob ameaça ambiental. Acreditamos que nosso projeto popular possa mudar isso, afastando a cidade das negociatas e do sequestro do interesse comum pelos interesses de velhas famílias e grupos econômicos locais. O acúmulo de debates com movimentos sociais, lideranças, acadêmicos e cidadãos nos credencia a começar uma virada de jogo a partir da cidade contra o neofascismo que assola o país. E isso só se fará com uma cidade democrática. E isso é só o começo!
Folha Santista: Quais são os principais eixos do seu plano de governo?
Guilherme: Nosso programa tem quatro eixos principais: 1) a redução das desigualdades sociais e combate às opressões, evidentes nas disparidades entre a Zona Noroeste, morros e Área Continental em relação à área nobre, que possuem não só disparidade de renda e investimentos, mas também forte traço de segregação racial; 2) o conceito de governo aberto, apoiado na transparência da gestão pública buscando institucionalizar a produção de variados dados e medidores para avaliação autônoma da sociedade civil;3) a socialização dos recursos, com a elaboração e execução do orçamento com participação popular, trazendo a periferia para o centro do orçamento; e 4) a socialização dos meios de governar, por meio da participação popular nos processos de tomada de decisão, criando uma democracia de alta intensidade.
Folha Santista: A cidade vem perdendo empregos no Porto de Santos, o que o senhor pretende fazer para que isso se reverta?
Guilherme: A omissão do atual governo nos temas de desenvolvimento e manutenção de postos de trabalho no Porto é lamentável. A atual gestão, inclusive, coloca o Porto contra a cidade, com empreendimentos ecologicamente perigosos e com as tentativas de avanço da área portuária contra áreas de habitação. Precisamos criar, em aliança com as cidades de Guarujá e Cubatão, uma frente que demande gestão compartilhada do Porto com o governo federal, trabalhadores e a iniciativa privada. Para combater a “reprimarização” do Porto, que hoje opera majoritariamente na dependência de commodities – que são a exportação e destruição de nossa natureza, apresentaremos projeto para instalação de área destinada a atividades comerciais e industriais voltadas às importações e exportações em harmonia com a cidade e ambientalmente corretas. Viabilizar um porto verde e sustentável, criando também um “Plano de Recuperação Ambiental”, também é um objetivo que pode criar muitos empregos.
Folha Santista: Qual sua posição acerca da instalação da usina de incineração de lixo em Santos?
Guilherme: Mesmo que seja implementada, com verniz de legalidade, é um crime ambiental e contra o bem comum. É mais uma negociata para enriquecer o lobby do monopólio de lixo, já que a Terracom, dona de um dos maiores contratos com a prefeitura, está também no conglomerado empresarial da incineradora. Ao invés de queimar lixo e poluir nosso futuro, preferimos não renovar o contrato de coleta com a Terracom. Vamos descentralizar esse serviço, apoiando as cooperativas. Trabalharemos com as subprefeituras e com zonas de triagem locais e alçando os catadores a título de agentes ambientais. Isso aumentará o nível da reciclagem e a conscientização popular, além de diminuir muito o volume de resíduos não rapidamente retornáveis. Por último, implantaremos um biodigestor anaeróbio no lugar do Sítio das Neves. Por meio de um processo biológico bem menos ameaçador, ele, sim, gerará biogás e biofertilizante. Este último será usado nas hortas públicas que criaremos, combatendo a especulação imobiliária e a insegurança alimentar. Não existe solução vertical para os resíduos, só podemos superar esse desafio com política transversal: abordando a questão econômica, ecológica e social. E com muita participação popular!
Folha Santista: O senhor tem alguma proposta para a revitalização do Centro? O que o pretende fazer nesta região da cidade?
Guilherme: Devemos fazer uma pergunta, já que se pode contar nas mãos as prefeituras que usam os instrumentos urbanísticos para desenvolverem um planejamento urbano socialmente justo: usá-los consistiria em uma reforma ou revolução urbana? Precisamos fazer uma profunda reforma urbana, utilizando instrumentos como o Parcelamento, Edificação ou Utilização Compulsórios (PEUC) e o IPTU progressivo sobre o tempo. Isso vai permitir iniciar um processo de mapeamento dos imóveis ociosos do Centro. Iremos torná-los moradia e comércio como restaurantes cooperativa temáticos com presença de imigrantes, pessoas em processo de reinserção socioeconômica e nossos músicos. Vamos ocupar esses espaços também com os movimentos de cultura. O início da deterioração é a subutilização! Por isso, vamos ocupar os espaços ociosos. Para ajudar nesse processo de “reavivamento” do Centro da cidade, com outro “Centro”, o Centro Municipal de Economia Solidária criaremos cooperativas de construção civil. Não basta prover moradia digna em lugares de boa infraestrutura social, mas é também necessário criar condições que permitam que os trabalhadores possam se manter nesses lugares.
Folha Santista: Quais propostas têm para a área de cultura e turismo da cidade?
Guilherme: Vamos descriminalizar a cultura e combater o tratamento dado aos artistas de rua, provendo formação cidadã e humanista aos agentes de segurança. Aumentaremos a participação do setor no orçamento (hoje, apenas 0,2%), mas fazendo com que a prefeitura seja apoiadora e não “aparelhadora” das políticas de cultura: na temática da economia solidária, queremos que o orçamento seja gerido de forma mais autônoma pelos movimentos de cultura de verdade, e não por novas “OS” (organizações sociais) desse setor. Uma cidade de cultura o ano inteiro e em todos os bairros, especialmente os mais pobres, é o que queremos. Teremos visão da cultura como agente emancipador e cidadão, ela pode ajudar nos processos de socialização dos meios de governar: apresentações culturais entretinham as pessoas antes das plenárias de decisão do orçamento participativo de Porto Alegre nos anos 1990, processo que queremos reinventar agora no século XXI em meio ao autoritarismo de Bolsonaro. Não há transformação sem cultura. Na questão do turismo queremos melhorar a balneabilidade das praias, fomentar cooperativas de historiadores e guias turísticos para fortalecer o turismo histórico e tornar o Carnaval de Santos um dos maiores do Brasil novamente. Assim, trabalharemos com as escolas de samba e comunidades, o que gera também trabalho e renda. Como vemos no Rio de Janeiro, o Carnaval não é gasto, é cultura, lazer democrático e investimento – já que as receitas aumentam com ele. Vamos trabalhar também a área continental, protegendo-a dos velhos grupos que querem atacar a região por meio da especulação imobiliária. Faremos essa parte da cidade ser uma potência sustentável em ecoturismo de base comunitária, produção em agrofloresta e economia solidária!
Folha Santista: O que pretende fazer para melhorar o atendimento na área de saúde, especialmente nas especialidades?
Guilherme: Iremos combater fortemente as Organizações Sociais, supostamente sem fins lucrativos, mas que são, na verdade, instituições usadas para loteamento de cargos de políticos e precarização do trabalho dos profissionais da saúde. Quando não pudermos romper tais contratos, vamos aumentar a fiscalização demandado o mesmo nível de transparência que a gestão pública deve ter. Além disso, vamos otimizar o atendimento em especialidades, informatizando todo o sistema de saúde municipal para que se possa ter acesso aos prontuários de pacientes de forma unificada, acesso a horários de consulta e marcação destas via internet. Com o combate às OS, vamos dar prioridade à saúde 100% pública, ao nosso SUS, maior conquista do povo brasileiro, e a mais contratações nas áreas de especialidades.
Folha Santista: Como avalia as duas gestões de Paulo Alexandre Barbosa?
Guilherme: O maior feito das gestões Paulo Alexandre Barbosa é com certeza seu marketing político. O grupo político que governa a cidade por mais de 20 anos, ao lado de outros velhos grupos econômicos e famílias, foi incapaz de resolver problemas estruturais da cidade: enchentes continuam, educação que não atinge as metas no Ideb, desigualdade profunda entre regiões, transporte caro, dentre outros tantos problemas. Essa minoria já teve sua chance. Depois da maior crise do atual sistema econômico, ainda não há um grande programa de transferência de renda na cidade. Criaremos a Renda Básica Cidadã, que irá chegar a R$ 100 e a 10% famílias da cidade até o fim de nosso mandato. Essa renda será paga através de um Banco Social Municipal e em moeda social, beneficiando o comércio local credenciado e para que a riqueza de Santos fique em Santos. A plutocracia santista, o governo dos ricos, não tem mais condições de governar por seus limites, compromissos e falta de criatividade para uma era que será de grandes transformações e desafios. Para uma nova colheita teremos de mudar de enxada! Chegou a hora das maiorias sociais, mulheres, negros e negras, LGBTs, dentre outros tantos grupos, tomarem seu lugar como maiorias políticas. Isso só será possível também com um governo da maioria como nós do PSOL defendemos!