O chefe da Advocacia-Geral da União (AGU), o santista André Mendonça, foi indicado formalmente para assumir a vaga deixada por Marco Aurélio Mello no Supremo Tribunal Federal (STF) pelo presidente Jair Bolsonaro. Sua indicação consta na edição do Diário Oficial da União (DOU) desta terça-feira (13). As informações são do Estadão.
O nome de Mendonça ainda precisa ser aprovado pelo Senado Federal, onde enfrenta resistência. Para ser aprovado, ele precisa do voto de pelo menos 41 dos 81 senadores. Muitos parlamentares da Casa têm reservas ao indicado de Bolsonaro pelo uso da Lei de Segurança Nacional (LSN) contra críticos do governo quando o atual advogado-geral da União ocupava o Ministério da Justiça.
Mendonça tem procurado senadores para garantir a aprovação de seu nome. “O André vem fazendo a peregrinação no Senado Federal. Na contagem dele, existe, sim, uma grande possibilidade de ser aceito”, ressaltou Bolsonaro.
“Terrivelmente evangélico”
Nascido em uma família humilde em Santos e criado nas hostes do calvinismo – movimento revolucionário que consumou divergências dentro da Igreja Católica no século XVI -, Mendonça tem como objetivo levar o slogan de Bolsonaro, “Deus Acima de Todos”, para a Suprema Corte e livrar a cara de seu benfeitor quando ele responder pelos diversos crimes que comete diariamente em seu governo.
André Mendonça mostrou ser o homem certo para Bolsonaro ao pregar a reabertura das igrejas em meio à pandemia durante sua intervenção no STF.
“Verdadeiros cristãos não estão dispostos a matar por sua fé, mas estão sempre dispostos a morrer para garantir a liberdade de religião e de culto”, disse na ocasião, casando o discurso cristão com a defesa da tal “liberdade” cunhada nos porões da Ditadura e que é defendida por Bolsonaro.
Fundamentalista, o pastor presbiteriano coloca a Bíblia acima da Constituição e conta com um dos cinco pontos do Calvinismo para fazer a defesa dos crimes de Bolsonaro: a “depravação total”.
Neste ponto, também chamado de “incapacidade total”, a doutrina da graça do Calvinismo afirma que “todos os homens são concebidos no pecado, e ao nascer como filhos da ira, incapazes de qualquer bem são ou salvífico, e inclinados ao mal, mortos em pecados e escravos do pecado; e eles não querem e nem podem voltar a Deus, nem corrigir sua natureza corrompida, e nem melhorá-la por si mesmos, sem a graça do Espírito Santo, que é aquele que regenera”.
Baseado na Bíblia – e não na Constituição, que lista ao menos duas dezenas de crimes cometidos somente no governo -, Mendonça pretende ungir Bolsonaro, acreditando que ele se livrou de pecados passados, como o enriquecimento espúrio através do sistema de corrupção das rachadinhas ou os ataques às mulheres, negros e homossexuais. Atitudes bem contrárias à doutrina do Cristo judeu, aliás.
Mendonça, assim como a crença de João Calvino, acredita que Deus escolhe os seus “eleitos” desde a eternidade, não com base na virtude, mérito ou fé previstos para essas pessoas, mas por sua “misericórdia”.
E por “misericórdia” Mendonça fará tudo para livrar a cara do criminoso que o alçará ao topo do Judiciário. Para que possam usar o “deus” que eles creem acima da Constituição. Para fazer do Brasil mais um país fundamentalista e iniciar a perseguição contra aqueles que não foram “eleitos” pelo deus Bolsonaro.
Anti-LGBT
Em dois momentos recentes da história André Mendonça já provou que pode ser o “ministro terrivelmente evangélico”. A primeira demonstração se deu quando o Supremo Tribunal Federal discutiu e votou a equiparação da LGBTfobia ao crime do racismo e a justificava foi a leniência do Congresso Nacional diante de tal tema.
Mendonça, representando a AGU, discursou contra a equiparação dos atos de ódios motivados pela LGBTfobia ao de racismo e, em sua fala, se utilizou do típico discurso da extrema direita de que todas as pessoas já são protegidas pela Constituição, mas só esqueceu do fato de que algumas morrem pela raça, gênero, identidade de gênero e orientação sexual.
“A AGU defende que a Constituição atribuiu com exclusividade ao Congresso Nacional a competência para definir a respeito da criminalização ou não da homofobia. Pede-se que se preserve a independência do Congresso Nacional para tomar essa decisão”, disse Mendonça.
Em seguida, defendeu que já existe na Lei previsão para coibir e punir atos de ódio. “Todo e qualquer cidadão, indistintamente merece a devida proteção na forma da lei, dentro dos mecanismos para tal proteção estão as ações positivas a serem prestadas pelo Estado em exercício das políticas públicas.”
Como exemplo de políticas públicas LGBT, André Mendonça citou o trabalho da ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, e afirmou que lá há “uma série de ações prioritárias na promoção de políticas públicas direcionadas à população LGBT”. Só faltou ele completar a sua fala e lembrar a todas e todos que, entre as políticas defendidas por Damares, está a de “re-orientação sexual”, no caso, da homossexual para a heterossexual.
Mas a militância terrivelmente evangélica de Mendonça não para por aí. Quando ministro da Justiça e Segurança Pública, André Mendonça, durante evento, afirmou que cristãos devem ter a liberdade de discordar e questionar a homossexualidade e, apear de entender que o respeito é um princípio cristão, “contudo, isso não significa que o cristão deve concordar ou não possa questionar o homossexualismo (sic) com base em suas convicções religiosas. O próprio STF assim reconheceu. Os direitos às liberdades de expressão e religiosa são inalienáveis”.
Mendonça se utiliza dos mesmos argumentos dos mercadores da fé que ganham dinheiro com a fé alheia e defendem o direito de propagar ódio às LGBT travestido de “liberdade de expressão”. Mas as declarações anti-LGBT do candidato ao STF não param por aí.
O indicado de Bolsonaro ao STF saiu em defesa da cantora gospel Ana Paula Valadão que, durante evento de 2016, declarou que a homossexualidade “não é normal” e associou as uniões entre pessoas do mesmo sexo ao HIV/Aids.
Em defesa da cantora, Mendonça afirmou que ela é vítima de perseguição. “Espero que a Justiça garanta os direitos desta cidadã brasileira, assim como tem garantido os direitos à liberdade de expressão de quem pensa em sentido contrário”, disse Mendonça.
Como se vê, André Mendonça é de fato o candidato “terrivelmente evangélico” de Bolsonaro, carrega uma mentalidade obscurantista e, ao defender as declarações de Valadão, concorda que a vida das LGBT é “anormal” e suscetível ao HIV/Aids, resgatando tudo que há de mais arcaico em torno dessa questão.
André Mendonça é um militante anti-LGBT às portas do STF.