O encontro entre um ex-casal não impede a imposição de uma medida protetiva de urgência contra o homem, proibindo-o de se aproximar dela, com a fixação mínima de distância de 300 metros, tal como não afasta o crime de descumprimento dessa decisão judicial, porque a proteção do tipo penal fica a cargo da Administração da Justiça.
Estes foram os argumentos que a 4ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) usou para negar um recurso de apelação feito por um homem condenado pelo crime do artigo 24-A da Lei 11.340/2006 (Maria da Penha), que versa sobre descumprir decisão judicial que defere medidas protetivas de urgência.
“O consentimento da vítima inserida em medida de proteção não desnatura o delito em tela, porquanto no crime de descumprimento de medida protetiva de urgência, o bem jurídico a ser tutelado, administração da Justiça, é o principal e, apenas indiretamente, a proteção da vítima”, destacou o desembargador Euvaldo Chaib, relator da apelação.
Além do delito da Maria da Penha, na mesma ação penal o recorrente foi condenado por lesão corporal dolosa cometida por razões da condição do sexo feminino da vítima (artigo 129, parágrafo 13, do Código Penal). As penas foram, respectivamente, de quatro meses e dois dias de detenção, em regime inicial semiaberto, e de um ano, quatro meses e dez dias de reclusão, em regime inicial fechado, sendo vedada a possibilidade de apelar solto.
A defesa do apelante pleiteou a sua absolvição no crime do artigo 24-A, sustentando a inexistência de dolo em relação ao descumprimento da medida de proteção. Porém, o relator citou o caráter “indisponível” do bem tutelado. “O consentimento da vítima, portanto, na aproximação do agressor não afasta a tipicidade do fato”.
Chaib ponderou que, no contexto de violência doméstica e familiar contra a mulher, é comum a vítima se colocar em perigo, acolhendo o agressor em razão da relação de afeto existente. Os desembargadores Camilo Léllis e Edison Brandão concordaram com o entendimento e foram junto com o relator para manter na íntegra a sentença do juízo da 5ª Vara Criminal de Santos.
Segundo o colegiado, “imprescindível a atuação estatal para proteger a vida e a integridade da fragilizada vítima. Esse o espírito da Lei Maria da Penha, diploma normativo destinado a reprimir a crescente violência doméstica. O escopo é a manutenção do respeito às decisões judiciais e à administração da Justiça”.
Reconciliação tentada
O descumprimento da medida protetiva e a agressão ocorreram no dia 28 de abril de 2023. De acordo com a vítima, de 38 anos, ela aceitou se reencontrar com o ex-namorado, de 42, porque estavam em tentativa de reconciliação. Porém, a mulher alegou que não solicitou antes a revogação da proteção da Maria da Penha porque não se sentia completamente segura em relação ao autor, devido ao seu histórico de violência.
O reencontro aconteceu em uma suíte do motel Studio, na Rua Campos Mello, 77, na Vila Mathias. A violência aconteceu durante uma discussão motivada por ciúme do acusado. Após o casal sair do estabelecimento, o homem levou a ex-namorada à Unidade de Pronto Atendimento (UPA) da Zona Leste, onde ela o denunciou aos enfermeiros.
Policiais militares foram acionados e prenderam o acusado na UPA. Ele aguardava no lado de fora do consultório o atendimento da vítima ser concluído. Conduzido à Delegacia de Defesa da Mulher (DDM) de Santos, o agressor foi autuado em flagrante e recolhido à cadeia.
Exame de corpo de delito constatou equimoses no olho esquerdo, na mama direita, no braço esquerdo e no tornozelo direito da vítima. O juiz Walter Luiz Esteves de Azevedo assinalou na sentença que o laudo da perícia demonstrou como certo o nexo causal entre a versão da ofendida e as lesões sofridas por ela.
Com informações de Eduardo Velozo Fuccia / Vade News