Eu sou uma mulher branca.
Algumas pessoas dirão que eu não sou branca, e eu direi pra elas que nunca sofri discriminação ou violência por conta da cor da minha pele.
Na minha família a minha tia, irmã da minha mãe, que é negra, não transmitiu pra mim os sofrimentos que com certeza viveu. Nossos parentes negros não nos colocam em posição de nos considerarmos negros se não somos na pele.
Há alguns meses comecei a me aprofundar no estudo sobre o feminismo e descobri, lendo Angela Davis, que a luta das mulheres por direitos civis e políticos começou a partir da luta abolicionista.
As irmãs Grimké, expoentes máximos dessa promessa de união, diziam que não poderia haver uma liberdade real da mulher se o povo negro continuasse escravizado.
Pensar na escravização de um povo por conta de sua cor é algo inconcebível pra mim, todas as leituras, estudos, relatos, me causam sensações de extrema tristeza e vergonha. Todas as tentativas de provar uma inferioridade imaginária para justificar uma história de violências, roubo, estupro. A marginalização sistemática de pessoas, semelhantes, por acharem que aquela epiderme não merece dignidade.
Semana passada o mundo se emocionou com a morte de T’Challa, Rei de Wakanda. Chadwick Boseman deu vida ao Pantera Negra e tornou-se o símbolo da resistência e da busca pela manutenção da ancestralidade de um povo.
No fim de semana, conversei com um amigo sobre como é bizarro que hoje, na luz da ciência e da filosofia, ainda exista um racismo tão violento, visível, institucionalizado, de modo que, pela arte, encontramos o jeito mais eficiente de mostrar como as coisas realmente deveriam ser.
Transformar uma obra ficcional em esperança, mostrar para crianças negras que elas carregam riquezas incontáveis no sangue, que nascem com todo o poder de um povo que honra a terra que os serve, que protege os seus com bravura por que sabe sua história.
Eu, enquanto uma mulher branca que não sofre discriminação racial e sente muita vergonha, desejo ver cada dia mais pessoas negras ocupando espaços, posições, cargos. Quero que meu filho veja pessoas diferentes dele em todos os lugares para que nunca se acostume com uma mentira transformada em padrão pelas mãos de gente que só pensa em não perder os próprios privilégios.
Lutaremos por uma sociedade que não enxerga ninguém como menos capaz por nada. Que não determina lugares de acordo com raça, gênero, classe. Por uma comunidade que não exalta populistas, ignorantes, torturadores. Por um país que jamais enxergaria na figura do nosso atual presidente quaisquer resquícios de esperança e salvação.
Por liberdade.
Por transparência e respostas claras para perguntas do tipo “Por que o Queiroz depositou R$ 89 mil na conta de Michelle Bolsonaro?”.
Wakanda, forever.
*Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião do Folha Santista