Era um menino bonito e cheio de sonhos. Na época, trabalhava em uma pizzaria e restaurante natural, a já extinta Maria Farinha. Um dia, chegou perto de mim muito tímido, extremamente simpático e me falou que gostava de cantar e tocar violão. Que um dia seria músico.
O tempo passou a galope e o menino começou a tocar em bares aqui e ali, já muito menos tímido, com uma linda voz, excelente repertório e, sobretudo, uma alegria imensa que irradiava por todos os poros. Ele me olhava com um sorriso cúmplice, como quem dizia: “tô chegando.”
E chegou mesmo. Rapidamente virou o Conrado Pouza que todos passaram a conhecer. Cantava por toda parte, cada vez levando mais gente, cada vez melhor. Virou o Conradinho, como ele mesmo dizia em suas postagens irreverentes, anunciando sempre cada lugar em que iria se apresentar.
Formou com outros três amigos a Banda do Canal 4 e lotava o Torto, sempre em um dia improvável de meio de semana. Virou onipresente na noite de Santos. Se não estivesse se apresentando, o que era cada vez mais frequente, ia visitar algum amigo e dava suas canjas, se divertia e ria a cântaros. Era, sem dúvida, um menino feliz, que gostava da vida.
Quando a Dri de Lorenzo e o Renato Rovai abriram a Casa Fórum – outro saudoso lugar – virou presença cativa. Cantava, conversava, declamava e era sempre o último a ir embora. Parecia, como bom boêmio, querer que a noite e a vida não acabassem nunca mais.
Era apaixonado por várias coisas para além da música. Certo dia, encontrei com ele encostado no paredão da Ponta da Praia com uma vara de pesca. Disse a ele que, apesar de nascer e viver junto do mar, nunca havia conseguido pegar um baiacu sequer. Ele sorriu e me deu uma grande aula, mostrou as iscas, como se segurava a vara entre outros truques. No final, me disse: “você não imagina o bem que isso me faz”.
De um dia para o outro e do nada, soube que ele foi estudar gastronomia. Outra novidade. Cozinhava, e bem, desde sempre. Passou, então, a juntar as coisas. Lembro bem dele no Quintal da Véia correndo da cozinha pro palco e vice-versa, em eventos memoráveis. Querido, como sempre, no dia de sua formatura foi festejado e aplaudido por seus colegas. Como poderia ser diferente?
Em 2021, lançou seu único álbum, o “Eu vou fazer qualquer negócio pra sair do Ócio”, produzido pelo Bruno De La Rosa, amigo inseparável. Um disco lindo que trazia, entre outras, a canção “Magano”, de Carlinhos Brown, que virou quase que um hino seu e até mesmo uma espécie de apelido.
Certo dia, recebeu o terrível diagnóstico da leucemia. Passou a travar uma luta incansável pela vida. O que se deu a partir de então foi, ao mesmo tempo, comovente e heroico. Mobilizou em torno de si uma enorme campanha de amigos, uma corrente digna do prestígio e afeto que contou com toda a cidade.
Após uma longa batalha, Conradinho superou a doença. Voltou a se apresentar e a ser festejado mais uma vez por onde passava. Tudo parecia estar bem e caminhar pra ficar cada vez melhor.
No último dia 7 de setembro, se apresentou na festa dos 40 anos do Torto. Como sempre, cantou e sacudiu a plateia. Naquele dia, no entanto, estava um tanto febril e não tinha ideia do que viria. Havia contraído Covid e, com sua condição, voltou ao hospital. Ficou uma semana internado e não resistiu. Ele, que havia vencido uma batalha enorme contra uma doença terrível, acabou abatido por uma gripe, com apenas 45 anos de idade.
A notícia de sua morte na noite desta quinta-feira (19) deixou a cidade consternada. Calado e triste fixei a expressão daquele menino bonito e tímido na memória. De repente, como se pudesse voltar há 20 e poucos anos no tempo, me peguei mostrando a ele as inúmeras homenagens nas redes como quem diz: “você conseguiu, olha como eles gostam de você”.
A noite, mais uma vez, insistiu em terminar antes do que o Conrado sempre desejava. A sexta-feira nasceu com um sol tímido que há muito não aparecia, feito um prenúncio de primavera. Logo mais à noite, músicos e público vão lotar os bares, como se nada houvera.
O sorriso do Conradinho, no entanto, vai sempre estar pelo entorno, parecendo anunciar que nada mais será como antes.