Com o fim das Olimpíadas e após sentir as emoções que ela nos proporcionou, reflito sobre os aspectos e semelhanças que envolvem a jornada dos atletas em comparação à dos artistas.
Sou músico e minha experiência me permite analisar com mais propriedade por esse prisma. Já pratiquei alguns esportes, fui torcedor fanático e ainda incluo nesse balaio o olhar de quem já realizou diversas atividades artísticas e eventos esportivos.
Esporte e cultura são fenômenos sociais, universais e complexos que se identificam, sobretudo, pela capacidade de emocionar seus espectadores.
Contudo, ainda é possível observar outras tantas similaridades. A arte abriga uma imensa variedade de estilos e modalidades, cada qual com suas características, belezas e singularidades. No esporte não é diferente. Solos, duos, times, bolas, arcos, barras e bandas, todos com a mesma capacidade de eternizar momentos. O som e as cores das ruas, quadras, palcos, piscinas e gramados inspiram e despertam o interesse pela prática.
O grito da torcida e o aplauso do público são combustíveis essenciais para os atletas e artistas buscarem as forças necessárias para alcançar seus sonhos e conquistas.
A vida do atleta de alto rendimento não é fácil, a de um artista também não. Ambos se dedicam para obter resultados e atuações perfeitas. Concentração, foco e criatividade também são essenciais. O atleta vive longe do convívio familiar pra treinar e competir. O músico, ator, bailarino e outros tantos profissionais da arte, logo cedo põem o pé na estrada, quase sempre aos finais de semana e feriados, enquanto a maioria das pessoas aproveita esse tempo pra confraternizar ou até mesmo assistir a alguma dessas apresentações.
Os dois segmentos são responsáveis por boa parte dos resultados positivos da economia do país, além de proporcionar oportunidades de emprego e renda para uma variedade imensa de profissionais que atuam nas transmissões, preparo e retaguarda.
É preciso muito amor e dedicação para enfrentar os desafios e seguir em frente nos dois ofícios. Entretanto, mesmo com todas as dificuldades apontadas, são escolhas e caminhos apaixonantes. Sem muito esforço, é possível enxergar poesia na ginga do drible inspirado num passo de dança.
O artilheiro vira canção e a angústia do goleiro, fonte de inspiração. A ginasta respira fundo ao ouvir a trilha sonora do seu solo. O silêncio que antecede o tiro da largada também é música. A melodia da voz do narrador é capaz de acelerar o batimento do torcedor apaixonado.
É preciso impor ritmo e sincronia em todos os movimentos que devem seguir na mais perfeita harmonia. A nota classifica ou dá o tom. O grito de campeão vira refrão e, no final do espetáculo, essa entrega reflete na sensação de alma lavada. As cortinas se fecham, as luzes se apagam, mas os treinos e ensaios continuam pra que tudo possa acontecer novamente. Que venham os próximos shows e que novos talentos despertem o interesse por chuteiras, luvas, sapatilhas, baquetas e violões. O som não pode e não vai parar e o apito de uma nova disputa em breve vai soar.
Mas vale lembrar que somos todos humanos e que vencedor mesmo é quem respeita seus limites e reconhece a importância de valorizar a paz interior. Que a arte e o esporte continuem a cumprir seu papel fundamental nesse palco encantado que chamamos de mundo, onde o baile, o jogo e a vida seguem em cartaz.
*Michel Pereira é músico e produtor artístico.
**Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião do Folha Santista.