A 8ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) rejeitou a alegação de “cerceamento de defesa” feita pelo advogado de um jovem acusado de matar a própria mãe para ficar com a herança, em Guarujá, e confirmou a decisão de primeiro grau de que o réu deve ser levado a júri por homicídio qualificado e fraude processual. Conforme o colegiado, a pronúncia não encerra a produção de provas em um processo e cabe ao juiz indeferir aquelas que considerar desnecessárias. O filho da vítima está foragido.
“A decisão de pronúncia não esgota a possibilidade de serem juntados novos documentos e realizadas outras diligências, até porque não demanda uma análise de provas arraigada (profunda), o que será feito em momento oportuno, consoante o disposto no artigo 422 do Código de Processo Penal”, justificou o desembargador relator Sérgio Ribas. Com esse voto, seguido pelos desembargadores Marco Antônio Cogan e Mauricio Valala, foi afastada a alegação do advogado Anderson Real de que houve “cerceamento de defesa”.
Devido à pressão recebida no pescoço enquanto era asfixiada mediante esganadura, a vítima sofreu fratura do osso hioide, conforme laudo necroscópico. Real discordou desse resultado e requereu a exumação do cadáver para a realização de novo exame cadavérico. A juíza Denise Gomes Bezerra Mota, da 1ª Vara Criminal de Guarujá, indeferiu o pedido, sob a fundamentação de que ele foi “genérico”, sem a indicação de qualquer fato concreto para justificá-lo. À época, a defesa não se insurgiu com essa negativa.
Na fase de apresentação das alegações finais, quando essa questão já estava preclusa, conforme a magistrada, o advogado formulou nova “impugnação genérica e infundada (do laudo), de forma que não há que falar em cerceamento da defesa técnica”. Com base no interrogatório do cliente no inquérito policial, Real põe em xeque a asfixia como causa da morte. Segundo o réu, ele discutiu com a mãe, que o teria agredido. Ao empurrá-la, ela teria caído e batido a cabeça na quina da porta ou em um espelho.
O advogado interpôs recurso em sentido estrito pleiteando a nulidade do laudo necroscópico. Subsidiariamente, pediu o afastamento das qualificadoras do motivo torpe, feminicídio e emprego de recurso que impossibilitou a defesa da vítima. Para o relator, há indícios suficientes da autoria a permitir a submissão do réu ao júri. Sobre as qualificadoras, Ribas frisou que a exclusão delas na pronúncia somente se justificaria se fossem manifestamente improcedentes, o que não é o caso dos autos.
“O deferimento ou não das provas requeridas compete ao magistrado condutor do feito (artigo 400, parágrafo 1º, do CPP), que, com base em seu prudente juízo, decidirá aceitar ou não a realização de diligências complementares e a produção de provas, sempre tendo por base a finalidade e a instrumentalidade do processo, sendo possível o indeferimento de pleitos que se mostrarem inúteis ou desnecessários, especialmente com aparente finalidade protelatória”, concluiu o relator, ao negar provimento ao recurso.
Ataque e simulação
Segundo a denúncia, o homicídio aconteceu na noite de 21 de dezembro de 2020, na casa onde Márcia da Quadra, de 44 anos, residia com o filho, Bruno Eustáquio Vieira, de 25. O crime ocorreu no quarto da vítima e, logo em seguida, o acusado foi até a sala, sentou-se no sofá e ligou a televisão. Posteriormente, voltou ao cômodo para se certificar da morte da mãe. Na manhã seguinte, ele foi treinar na academia. Ao retornar, simulou desespero ao encontrar o cadáver, comunicando o falecimento a conhecidos por telefone.
Inicialmente, o caso foi registrado como morte suspeita. Após a necropsia revelar a causa do óbito, o filho passou a ser suspeito. Testemunhas revelaram que o relacionamento dele com a mãe era marcado por conflitos. Elas também informaram que Márcia possuía câmeras de segurança dentro do imóvel. Investigadores descobriram que elas foram desconectadas do DVR – equipamento gravador e armazenador de imagens –, que sumiu, mas depois foi achado escondido dentro do forno.
O acesso às imagens do DVR possibilitou esclarecer a dinâmica do crime, mas o acusado apresentou a versão de que não teve intenção de matar a mãe e apenas a empurrou em reação a suposta agressão. Conforme o MP, ao esconder o equipamento de gravação, o réu também praticou o crime de fraude processual, porque inovou artificialmente, na pendência de investigação criminal, o estado de coisa, com o fim de produzir efeito em processo penal e induzir a erro juiz ou perito.
A Justiça recebeu a denúncia contra Bruno no dia 1° de junho de 2021 e decretou a sua prisão preventiva. Sem ser localizado, ele foi citado por edital. A acusação do MP narra que o réu se formou em Direito, mas não tinha a intenção de trabalhar e começou a pressionar a mãe para lhe custear o curso de Medicina. O rapaz ainda exigiria dela bens e dinheiro para os seus gastos com lazer. Insatisfeito por não ter atendidos os seus anseios materiais, o denunciado decidiu matar a vítima para herdar o seu patrimônio.
Com informações de Eduardo Velozo Fuccia/Vade News