O juiz relator da 1ª Câmara do Tribunal de Justiça Militar de São Paulo, Fernando Pereira, negou o argumento usado pela defesa do coronel da Polícia Militar (PM), Cássio Pereira Novaes, atualmente na reserva, sobre o caso em que é acusado de ter assediado sexualmente a soldado Jéssica Paulo do Nascimento, ao se valer da sua posição hierárquica.
“Se esse tipo de conduta se revela repugnante e intolerável em qualquer ramo de atividade profissional, a sua gravidade alcança ainda maior relevância quando praticada em uma instituição organizada com base na hierarquia e na disciplina, conforme preceito constitucional”, foi a conclusão do juiz relator do caso.
A sentença foi acompanhada na íntegra pelos juízes Paulo Adib Casseb e Clovis Santinon. Além disso, mantiveram o argumento que condenou o oficial de alta patente a um ano e cinco meses de detenção, em regime aberto, aplicada suspensão condicional da pena pelo prazo de dois anos. O réu não recorreu do acórdão, que transitou em julgado.
A conduta criminosa do coronel da reserva mexeu com a liberdade sexual da vítima, a autoridade e a disciplina militar, diz a decisão do Tribunal da Justiça Militar de São Paulo (TJM-SP). A defesa apelou e pediu a absolvição, ao alegar insuficiência de provas e acusando que os “prints” colocados nos autos não estão em sua totalidade.
O relator não aceitou a argumentação da defesa. Ainda na decisão, o juiz rechaça que o crime de assédio não é o do tipo que se pratica perante outras pessoas “bastando ver que foi praticamente todo cometido por meio de conversas via aplicativo WhatsApp, que foram, inclusive, reconhecidas pelo réu como verdadeiras”, assinalou o relator.
Conforme o acórdão, a versão da vítima possui especial relevância nesses delitos. Ademais, a conduta indecorosa do réu é reforçada pelos prints, que revelam “linguagem chula e ofensiva” de Cássio, ao adotar “comportamento desrespeitoso e insolente, buscando com esse proceder ter um relacionamento íntimo sexual com sua subordinada”.
Por quatro votos a um, o Conselho Especial de Justiça condenou o coronel da reserva, em outubro de 2022. A sentença diz que “a palavra da vítima e os ‘prints’ de seu aparelho de telefone celular são eloquentes em provar o descrito na denúncia. O réu admitiu a existência e o teor dos diálogos por meio do aplicativo WhatsApp contidos na prova pericial”.
“Reafirmando a conclusão a que chegou o colegiado de primeiro grau, não resta dúvida sobre o poder hierárquico do réu em relação à vítima, afinal exerceu a função de comandante do 50º Batalhão de PM Metropolitano, na Capital, de 2018 até abril de 2021”, finalizou o relator. Nesse período, o réu ocupava o posto de tenente-coronel.
Relembre o caso
A denúncia é da soldado Jéssica Paulo do Nascimento. O conteúdo da acusação diz que ele a convidou para sair, mesmo sabedor de que os dois eram casados. Com a recusa da soldado, o assédio sobre ela aumentou a ponto de a Jéssica pedir transferência para o 45.° BPM/I de Praia Grande.
Devido às seguidas tentativas de assédio, a soldado Jéssica desenvolveu diversos transtornos de ordem psíquica e pediu exoneração, conforme consta nos autos.
De acordo com a soldado, ela não denunciou o militar por assédio sexual de imediato, porque seria a palavra dela contra a de um comandante.
Por causa da conduta do réu, o assistente da acusação e advogado, Sidnei Henrique dos Santos, disse que a soldado ajuizará ação de dano moral e também material contra o Estado.
Conforme o representante da vítima, os assédios chegaram a um grau insustentável, ao motivar Jéssica a pedir exoneração e abortar toda uma carreira promissora na PM que ela tinha pela frente.