Foto: Fábio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

A liberação da presença de cães na orla da praia de Santos, projeto de lei aprovado em primeira votação na Câmara Municipal, tem provocado muita polêmica. A dermatologista Fernanda Modolo de Paula de Moura Campos não concorda com a medida.

“Particularmente, sou contra a proposta, pois, a meu ver, a população não se encontra totalmente preparada para realizar todos os cuidados necessários de higiene para que os cães frequentem a areia. São indispensáveis a carteira de vacinação, vermifugação em dia e uso da coleira e guia”.

Além disso, Fernanda questiona a presença de fiscalização efetiva, caso o projeto de lei seja aprovado. “A praia de Santos é um local de grande movimentação de pessoas, por isso os cuidados devem ser redobrados”.

No que se refere aos riscos, a dermatologista afirma que a presença dos animais na praia pode causar problemas de saúde tanto para os cães quanto para as pessoas. “As fezes dos animais podem conter alguns tipos de vermes que transmitem doenças para os humanos, como por exemplo a larva migrans cutânea, também chamada bicho geográfico”.

Trata-se de uma infecção provocada pelas larvas de parasitas que vivem no intestino dos cães e gatos. Ao entrar em contato com a pele, começam a se locomover e deixam marcas vermelhas, formando uma espécie de caminho, provocando coceira e inflamação.

Em relação aos problemas de saúde nos animais, ela menciona verminoses, que o cachorro também pode contrair, e efeitos nocivos do sol, como câncer de pele, além de queimadoras e desidratação.

Fernanda alerta que as crianças podem ser as maiores vítimas. “Além das mordeduras de cães, as crianças podem adquirir bicho geográfico com maior frequência, pois têm contato da pele com solos contaminados nas brincadeiras na areia da praia”.

Ela destaca as principais doenças dermatológicas que os cães podem transmitir: tinhas (micoses), sarna de origem animal, larva migrans cutânea (bicho geográfico), além da doença de lyme, transmitida por carrapatos presentes nos cachorros.

Individualismo

O dermatologista Jaques Alexandre de Mello, a princípio, não vê problemas em relação à presença de cães na orla da praia santista, desde que os donos tenham consciência e cuidados adequados. “No entanto, como o ser humano é muito individualista, melhor não permitirem”, resume.

Ele também acredita que há perigos ao se pisar na urina e nas fezes dos animais. “Crianças e adultos teriam riscos semelhantes, pois, no caso da larva migrans, o contato é com a areia contaminada. Crianças pequenas teriam risco maior de verminoses intestinais e infecções, pelo hábito de levar as mãos à boca a todo instante”, avalia.

Para evitar a transmissão do bicho geográfico, o dermatologista acredita que só seria possível “com vermífugos a todos os cães e gatos, o que é totalmente inviável. Trocar a areia, só em pequenos ambientes e duraria muito pouco até ser contaminada novamente”, completa.

A favor

O veterinário Michel Ferreira Fasanelo Gomes, por sua vez, é contra a proibição. “Hoje em dia a gente vê liberação de cachorros em hotéis, em shoppings. Não vejo motivos para não passear na praia também”.

Ele não crê que existam grandes riscos com a presença dos animais na praia. “Quanto ao excesso de cães, eu imagino que, talvez no início, como toda novidade, vai acontecer. No entanto, acredito que logo isso seja controlado. Muita gente não vai querer passear com o cachorro na praia, porque suja, tem que dar banho quando chegar em casa, dá mais trabalho”.

Em relação ao risco maior de as pessoas serem atacadas, o veterinário entende que a maioria das pessoas é prudente. “Acho injusto punir todo mundo por causa de um grupo pequeno que não respeita as regras. Comparo com a prática de dirigir um automóvel. A maioria das pessoas toma cuidado, respeita as sinalizações, limites de velocidade, mas algumas não respeitam, o que acaba provocando acidentes. Seria a mesma coisa de proibir todo mundo de dirigir, porque algumas pessoas são imprudentes no trânsito”.

Michel não acha que proibir seja a forma correta de tratar o problema. “O certo é ter as regras e punição para quem não respeitá-las.  Um cachorro que é mais bravo, que apresenta um risco maior de atacar alguém, precisa, necessariamente, usar focinheiras. Enfim, informação e educação são mais importantes do que proibição”, avalia.

Quanto às doenças que podem ser transmitidas pelos cães, o veterinário entende que a maioria dos animais será vacinada e vermifugada. Ao mesmo tempo, ele diz que a lei vai impor que as pessoas recolham as fezes dos animais, como ocorre nas ruas.

Uma das principais preocupações em relação ao tema é com os riscos de transmissão do bicho geográfico.

“Trata-se de um parasita intestinal, presente nos cães e nos gatos que não são vermifugados. É uma doença chata, mas não é grave e dá para prevenir com a vermifugação dos animais”, acredita.

Apesar de defender a presença de cães na orla, Michel acha interessante definir horários para os passeios. “Falava-se no início de colocar restrição de espaço, alguns canais poderiam e outros não. Isso criaria mais polêmica. Acho que definindo horários e dias específicos seria mais justo. Respeito muito a opinião de quem é contra, mas acho importante sempre discutir todos os prós e contras e, em minha opinião, há muito mais prós do que contras”.

Só em 2021

A polêmica provocada pelo assunto fez com que a proposta voltasse para a Comissão de Proteção e Bem-Estar Animal da Câmara Municipal. A decisão, com isso, fica para 2021.

O projeto prevê a permissão da circulação de cães por toda faixa de areia e água, entre 17 e 8 horas. Fora deste horário, o acesso dos animais à praia continuaria vetado.

De acordo com o autor da proposta, o vereador Adilson Junior (PP), o tema provocou a divisão de opiniões na cidade.