É comum o brasileiro colocar a culpa de algo que deu errado na vítima. Ah ela foi estuprada, mas olha a roupa que ela estava vestida. Ele foi assaltado, mas também olha a hora que ele estava na rua.
E agora nessa tragédia da Baixada Santista, que já deixou 21 mortos e 28 desaparecidos e milhares de pessoas perderam tudo que tinham, ainda tem gente que tem coragem de dizer: mas também essas pessoas moravam em locais irregulares.
O governador de São Paulo, João Doria, disse isso em coletiva de imprensa em Santos. Destacou que é um problema que não se resolve rapidamente. Sim, é verdade, mas é preciso lembrar a quem cabe resolver.
Defender políticas habitacionais que são de responsabilidade dos poderes executivos é o primeiro passo para evitar que novas tragédias aconteçam. As pessoas que ocupam os lugares mais vulneráveis não estão lá porque querem. Mas sim porque não conseguem pagar um aluguel nas partes mais estruturadas das cidades, a começar pelas burocracias de contrato. Quiçá comprar um imóvel. Em geral, quem recebe cerca de um salário mínimo mal consegue pagar as necessidades básicas para sobreviver. Sem contar que muita gente está desempregada. São quase 12 milhões de pessoas, segundo o IBGE.
Num país extremamente desigual como o Brasil é fundamental um Estado forte que consiga minimizar isso. Que não começou hoje. Você sabe o que tem sido feito nessa área na sua cidade? Quais políticas de moradia estão sendo implementadas?
Por outro lado alguém pode lembrar: mas nunca choveu tanto. Sim, é verdade, o índice das chuvas em fevereiro bateu recorde. Foi o maior desde 1939, segundo a Prefeitura de Santos. E com isso vem as enchentes, alagamentos e, principalmente, os deslizamentos nos morros. E aí vem outra questão? O que estamos fazendo para lidar com as mudanças climáticas?
Dados do Inmet (Instituto Nacional de Meteorologia) analisados por pesquisadores mostram que o clima em São Paulo, por exemplo, sofreu mudanças intensas nos últimos 60 anos. Chove cada vez mais e as temperaturas subiram. Eles creditam as alterações ao aquecimento global.
Portanto negar os impactos que causamos ao meio ambiente não é uma boa estratégia. Seria melhor encararmos de uma vez que é preciso pensar a forma como estamos produzindo e consumindo, além de adotar práticas sustentáveis. Por que não investir em captação das águas das chuvas? O que estamos fazendo com o nosso lixo? Você sabe para onde ele vai? E os rios e represas?
Cabe a todos nós nos conscientizarmos do que podemos fazer para melhorar onde vivemos e não apontar o dedo para as vítimas. Isso significa deixar o ódio de lado e pensar no que realmente importa. Algumas perguntas que podem nos trazer dias melhores neste ano em que teremos eleições: Quais políticas públicas o partido que você vai votar defende? O que o candidato que você vai votar na sua cidade pensa sobre habitação e o meio ambiente? O que cada um pretende fazer para que a solução do problema não seja sempre de longo prazo?