Santos e a invasão de ratos na orla: por que o problema é constante?

“É verão, tem mais gente na praia, há muita oferta de comida. A pessoa se alimenta e deixa cair muitos restos no chão. Os ratos gostam de comida”, afirma o veterinário Michel Gomes

A equipe da prefeitura tenta combater os roedores - Foto: Susan Hortas/Prefeitura

Durante as temporadas de verão, com o aumento do fluxo de pessoas nas praias de Santos, tanto turistas quanto moradores locais, a cidade se vê às voltas com um problema antigo e que se repete com frequência: a invasão de ratos na orla.

A situação traz alguns riscos para a população. “O perigo é, principalmente, em relação às doenças que os roedores podem transmitir. A mais conhecida é a leptospirose, mas há várias outras, entre 50 e 60 enfermidades possíveis que os ratos podem transmitir”, relata o veterinário Michel Ferreira Fasanelo Gomes.

Existem alguns cuidados que precisam ser tomados. “O ideal, se pensarmos na leptospirose, que é a mais comum, é evitar o contato com água de chuva, principalmente lugares que têm alagamento, que são mais fáceis de ter a presença da bactéria da doença. Em contato com a mucosa, através de uma lesão pequena que seja, pode penetrar e causar infecção”, explica o veterinário.

Ele acredita que o aumento do número de ratos na orla tem relação direta com a estação do ano. “É verão, tem mais gente na praia, turistas, há muita oferta de comida. A pessoa se alimenta e deixa cair muitos restos no chão. Tem gente que faz piquenique no jardim da praia. Então, o que sobra, os restos de alimentos, atraem os ratos. Eles gostam de comida. Quanto mais comida tiver no lugar, mais eles vão se reproduzir”, afirma.

Marco Aurélio Neves da Silva, engenheiro agrônomo da Secretaria de Serviços Públicos (Seserp) da prefeitura, reforça que o descarte irregular de lixo é o principal desafio no combate aos roedores.

“O lixo concorre com o veneno aplicado nos canteiros. Claro que o roedor vai preferir a comida do que as armadilhas. Por isso, as equipes entram tentando eliminar ao máximo restos de alimento e de embalagens para reduzir a quantidade de ratos”, ressalta.

A orla santista volta a sofrer com a invasão de ratos – Foto: Divulgação/Prefeitura

Força-tarefa

A prefeitura montou uma força-tarefa para combater os roedores. Recentemente, a equipe passou a aplicar mais um produto, que está sendo utilizado em complemento às armadilhas comestíveis já instaladas nas tocas.

A Seção Vigilância e Controle Zoonoses (Sevicoz) informa que os produtos usados na desratização são inibidores da coagulação (Flocumafeno e Cumatetralil) e pertencem ao grupo químico Cumarínicos.

Em casos de intoxicação, o principal sinal é de fácil identificação por profissionais de saúde: sangramento em mucosas. O antídoto utilizado é a Vitamina K, disponível nas unidades de saúde.

Em forma de pó, o produto, que tem o Cumatetralil como princípio ativo, é aplicado nas tocas cavadas pelos próprios ratos nos canteiros da orla. Enquanto o raticida que já é utilizado pela Seção de Vigilância e Controle de Zoonoses (Sevicoz) deve ser ingerido pelo rato, o novo veneno acaba ficando nos pelos dos roedores quando eles entram e saem dos esconderijos. Assim, os animais lambem o produto ao se limpar e morrem em dois a três dias, enquanto a armadilha comestível mata em três a cinco dias.

Dificuldade

Para Michel Gomes, é muito difícil o controle de qualquer tipo de praga, não só em Santos. “Você sempre vai estar interferindo em outras espécies. Não há um produto específico para cada espécie. Se tivesse um veneno que matasse só os ratos e não matasse nenhum outro mamífero, roedor ou inseto seria mais fácil de ter o controle. Mas isso não acontece, não existe. Infelizmente, os produtos acabam interferindo no ecossistema”, reflete.

Proibições

A prefeitura informa, ainda, que, conforme o Código de Posturas do Município, é proibido pisar nos canteiros e na grama da orla. O jardim é tombado e, segundo a Lei Complementar 973 de 25/08/2017, artigo 14, é proibido nos jardins: realização de piquenique, colocação de cadeiras e ainda prática de esporte.

“Na verdade, não tem sequer uma placa no jardim da praia indicando que é proibido pisar, o que seria ideal. Eu imagino que isso aconteça com mais frequência com as pessoas que não moram em Santos, pela falta de informação”, destaca o veterinário.

“A pessoa vê o jardim bonito, florido, e acha que é um lugar seguro. Então, é preciso evitar de deixar as crianças e os cães ter contato com as folhagens. O pessoal costuma passear muito na praia e, às vezes, solta o cachorro para ele ficar correndo no jardim. O cão, por instinto de caça, se ele perceber algum movimento no jardim de rato ou de passarinho, vai acabar entrando no meio das plantas. Por isso, há um risco maior de o animal chegar na toca, colocar o focinho e ter contato com o produto”, alerta Michel.

Ainda de acordo com a prefeitura, as concentrações dos produtos usados na desratização estão dentro do permitido pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Segundo informe, para que um cão de 10 quilos fosse envenenado, seria necessária a ingestão de aproximadamente 22 gramas do pó Cumatetralil.

“A prefeitura fala que é uma quantidade insuficiente para ser uma dose letal para o cachorro. Mas, de acordo com o tamanho e a quantidade que ele ingerir, pode ter uma gravidade maior. O ideal é evitar de ter acesso a esses lugares”, aconselha Michel.

Gatos x ratos

O embate da cidade contra os ratos não é novidade. As formas de combate aos roedores é que, às vezes, são, no mínimo, polêmicas. Na década de 1980, houve uma grande invasão de ratos na orla.

O então prefeito Oswaldo Justo resolveu infestar o jardim da praia com gatos, na esperança de que os felinos resolvessem a situação.

Evidentemente, a medida não funcionou. Além de não eliminar os ratos, outro problema surgiu: a enorme quantidade de gatos vivendo na orla santista, o que obrigou o recolhimento e a castração dos animais.

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