Por Martina Salvo*
A violência sexual persistente no Brasil é um reflexo claro das profundas desigualdades sociais e raciais que marcam a nossa sociedade. Dados recentes do Núcleo de Estudos Raciais do Instituto de Ensino superior (Insper), com base em informações do Sistema Nacional de Atendimento Médico do Ministério da Saúde (SUS), revelam uma realidade alarmante: cerca de 40% das vítimas de estupro no Brasil são crianças ou adolescentes negras, o dobro da incidência registrada com meninas brancas.
O estudo expõe que seis a cada dez registros de estupro no país envolvem meninas com menos de 18 anos. A maioria das vítimas tem entre 11 e 17 anos, correspondendo a 39,2% dos casos. Esta estatística evidencia a vulnerabilidade das meninas e adolescentes no Brasil e destaca a disparidade racial presente nesse tipo de crime.
A proporção de mulheres pretas e pardas de todas as faixas etárias vítimas de crimes sexuais tem aumentado nos últimos anos, indicando que a violência sexual afeta desproporcionalmente as mulheres negras.
Um aspecto crucial dessa realidade é o contexto dos agressores. Em casos envolvendo crianças e adolescentes, cerca de 50% dos agressores pertencem ao círculo de convívio familiar da vítima. Este dado é perturbador, pois revela que o lar, um lugar que deveria ser seguro, frequentemente não o é para muitas meninas.
Quando observamos a faixa etária adulta, as mulheres negras continuam a ser as maiores vítimas, numa proporção de 2 para 1 em relação às brancas.
Há uma necessidade urgente de políticas públicas específicas que abordem essa questão de maneira eficaz. Não se trata apenas de segurança pública, mas de justiça social. O racismo estrutural no Brasil não só marginaliza a população negra em termos de oportunidades econômicas e educacionais, mas também as torna mais vulneráveis à violência.
Além disso, é essencial um trabalho de conscientização e educação para combater os estereótipos raciais e de gênero que perpetuam a violência. A sociedade precisa reconhecer e enfrentar seus preconceitos, entendendo que a luta contra a violência sexual também é uma luta contra o racismo.
É imperativo fortalecer as redes de proteção, aumentar a punição para agressores e implementar políticas que promovam a igualdade racial e de gênero. Somente assim poderemos avançar rumo a uma sociedade mais justa e segura para todas as meninas e mulheres.
*Martina Salvo é jornalista e autora do livro “Corpo em Silêncio”.
**Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião do Folha Santista.