Com o objetivo de lutar pela prorrogação da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 828 (ADPF 828), que suspende os despejos e as desocupações até 31 de março de 2022, a campanha Despejo Zero realiza, nesta quinta-feira (17), atos em diversas cidades do país.
A iniciativa é uma articulação nacional organizada por movimentos sociais e entidades, inclusive com apoio internacional. A proposta é monitorar e suspender qualquer violação de direitos e atividades que visem despejos e remoções forçadas de famílias e comunidades no campo e na cidade.
O núcleo da campanha Despejo Zero da Baixada Santista e a Associação Cultural José Martí promovem uma marcha, com saída da Ocupação Anchieta (Rua São Paulo, 93, Vila Belmiro), às 13 horas, passando pela Justiça do Trabalho e terminando no Fórum de Santos, na Praça José Bonifácio.
No mesmo dia, a organização da campanha irá protocolar, no Supremo Tribunal Federal (STF), uma petição requerendo audiência com o ministro Luís Roberto Barroso, assim como a prorrogação dos efeitos da liminar.
O novo pedido se baseia nos efeitos da pandemia da Covid-19, especialmente o aumento significativo da miséria no país.
“Durante a pandemia foi registrada uma explosão de ocupações irregulares, que continua a crescer, o que demonstra o grau de vulnerabilidade de boa parte da população, além da ausência de políticas habitacionais voltadas para pessoas de baixa renda e sem renda”, avalia Vitoria Santos Oliveira, da Associação José Martí.
“No Brasil todo, em torno de 125 mil famílias vivem sob ameaça de despejo, o que corresponde a quase meio milhão de pessoas, segundo dados da Campanha Despejo Zero. No estado de São Paulo, os números são alarmantes: quase 40 mil famílias podem ficar sem um teto nos próximos meses”, revela Maria Carolina Maziviero, arquiteta e urbanista, docente e pesquisadora na Universidade Federal do Paraná, integrante da Campanha Despejo Zero e Rede BR Cidades Núcleo Curitiba.
Situação é grave na Baixada Santista
Na região da Baixada Santista, dezenas de famílias estão ameaçadas de despejo ainda em abril, caso a liminar expedida pelo ministro Luís Roberto Barroso perca sua eficácia.
“Em Praia Grande, há cinco anos, 20 famílias ocuparam os alojamentos do campo do Unidos Futebol Clube, no bairro Tupiri, então abandonado pelo poder público. A ocupação, agora, sofre com ação de reintegração de posse, ajuizada pela prefeitura”, conta a advogada Gabriela Ortega, integrante do Instituto Brasileiro de Direito Urbanístico, Rede Br Cidades Núcleo RMBS, Renap – Rede Nacional de Advogadas (os) Populares e Campanha Despejo Zero.
Ela detalha que na subida do Morro do Itararé, em São Vicente, a ocupação Nossa Senhora de Lourdes é composta por 80 famílias, que também brigam na justiça pela manutenção de suas casas. A Santa Casa de Santos insiste em removê-las, alegando o risco geológico da área.
“Entretanto, a suposta proprietária de quase toda região do Itararé e do José Menino aluga inúmeras casas de forma irregular, sem realizar loteamento tal qual previsto em lei”, afirma Gabriela.
Em Santos, são duas as comunidades gravemente ameaçadas de despejo, sem amparo da política habitacional municipal.
São elas: a Ocupação da Rua João Carlos, no Jardim São Manoel, alvo de desejo administrativo em 2021, que detém uma liminar que impede a prefeitura de novas remoções forçadas. “Essa liminar está baseada tanto na ilegalidade do despejo administrativo, ou seja, sem ordem judicial, quanto na proibição de remoções por força da ADPF 828 do STF”, explica a advogada.
Já a Ocupação Anchieta, composta por 70 famílias que residem no local há 22 anos, está ameaçada de despejo pela 1ª Vara do Trabalho de Santos. Mesmo diante de uma ação de usucapião em tramitação desde 2001, e tendo conhecimento de que famílias residiam no local, a justiça trabalhista permitiu a venda do imóvel a um grupo de empresários.
“O pedido de imissão na posse (despejo) está nas mãos da juíza, que irá analisar a partir de 1 de abril. A prefeitura de Santos permanece alheia ao processo. Sua indicação é para que as famílias se cadastrem no Conselho Municipal de Habitação, no segmento por moradia de interesse social, e no Centro de Referência da Assistência Social (Cras), ou seja, não há nenhuma política de atendimento emergencial para as pessoas, caso percam seus lares”, avalia Gabriela.
A organização da campanha reforça que a prorrogação da liminar que suspende os despejos e remoções é imprescindível para a proteção de milhares de famílias em situação de vulnerabilidade.
“No entanto, a prorrogação precisa ser acompanhada da retomada de políticas públicas para moradia voltadas para a população de baixa renda, para além da pandemia”, completa Vitoria.